Para participar com fruto da Santa Missa
Para viver bem a Semana Santa, é
importante descobrir como receber os frutos do sacrifício de Cristo no
Calvário. E já que, na realidade, o sacrifício da Missa é substancialmente o
mesmo que se deu na Cruz, essa questão se resume a como participarmos bem da
Santa Missa.
Até agora, vimos que o sacerdócio
de Cristo começou com Sua encarnação. O próprio ato de fazer-se homem
constituiu Jesus sacerdote porque, pela união hipostática, Ele tornou-se
“pontífice”, intermediário entre as duas naturezas: a humana e a divina. E,
desde que veio ao mundo, Jesus começou a sua oblação interior, oferecendo a
Deus adoração, ação de graças, súplica e reparação perfeitas. Já na carpintaria
de Nazaré Ele se entregava ao Pai com amor e generosidade infinitas. Porém,
tecnicamente, aquilo ainda não era sacrifício, já que este exige uma vítima
externa, passiva e capaz de expressar exteriormente a oblação interna e ativa
que se passa no coração do sacerdote.
Tudo isso já teria sido
grandioso, mas Deus quer que também nós participemos disso. Quando São Paulo
afirma que completa em sua carne aquilo que falta aos sofrimentos de Cristo
[1], não está querendo dizer que o perfeito sacrifício de Cristo seja, de algum
modo, insuficiente. Quer dizer, ao invés, que, após a sua doação no Calvário, é
necessário que recebamos os frutos de Sua redenção.
Isso é feito através da
instituição dos sacramentos. A economia sacramental é o modo que Deus encontrou
para distribuir os frutos da redenção em nossa vida. Por isso, todos os
sacramentos estão ligados de alguma forma à Cruz de Cristo. O Batismo e a
Eucaristia, por exemplo, estão prefigurados no sangue e na água que jorraram do
lado aberto de Jesus [2].
Ao instituir a Santa Missa, Deus
quis que ela fosse substancialmente a mesma coisa que foi o Seu sacrifício no
madeiro da Cruz [3], sendo diverso, porém, o modo como são oferecidos. É o que
afirma o Concílio de Trento: “Uma e mesma é a vítima: e aquele que agora
oferece pelo ministério dos sacerdotes é o mesmo que, outrora, se ofereceu na
Cruz, divergindo apenas o modo de oferecer” [4]. E é o que explica, com
clareza, o Papa Pio XII, na encíclica Mediator Dei:
“Na cruz, com efeito, ele se
ofereceu todo a Deus com os seus sofrimentos, e a imolação da vítima foi
realizada por meio de morte cruenta livremente sofrida; no altar, ao invés, por
causa do estado glorioso de sua natureza humana, ‘a morte não tem mais domínio
sobre ele’ (Rm 6, 9) e, por conseguinte, não é possível a efusão do sangue; mas
a divina sabedoria encontrou o modo admirável de tornar manifesto o sacrifício
de nosso Redentor com sinais exteriores que são símbolos de morte. Já que, por
meio da transubstanciação do pão no corpo e do vinho no sangue de Cristo,
têm-se realmente presentes o seu corpo e o seu sangue; as espécies
eucarísticas, sob as quais está presente, simbolizam a cruenta separação do
corpo e do sangue. Assim o memorial da sua morte real sobre o Calvário
repete-se sempre no sacrifício do altar, porque, por meio de símbolos
distintos, se significa e demonstra que Jesus Cristo se encontra em estado de
vítima” [5].
Então, o grande segredo para
participar com fruto da Santa Missa está em entregar-se junto com Cristo que se
entrega no altar. Infelizmente, nos métodos pastorais modernos, as pessoas têm
tentado ser cristãs sem oblação. No entanto, é preciso oferecer-se, de fato,
como vítima. Caso contrário, não se participa da Missa com o coração, mas
apenas “de corpo presente”.
Santo Alberto Magno, professor de
Santo Tomás de Aquino, escreve que, “quando o padre oferece o sacrifício da
Cruz na Missa, a intenção é de se oferecer atualmente ao Pai através d’Aquele
que se ofereceu a Si mesmo na Cruz”. É essa a razão de ser da doxologia, na
qual o padre, movido pela caridade, se oferece ao Pai por Cristo - isto é,
tendo-o como veículo -, com Cristo e em Cristo - ou seja, em profunda comunhão
com Ele.
Para que a comunhão eucarística
aumente em nós a caridade e torne o nosso coração mais parecido ao coração
eucarístico de Jesus, é preciso que sejamos, junto com Ele, sacerdote e vítima.
Na perspectiva do sacerdócio comum dos fiéis, todo cristão batizado é chamado a
configurar-se a Cristo, ofertando a sua oblação na assistência atenta e piedosa
do santo Sacrifício. O ministro ordenado, além disso, oferece a sua oblação no
sacramento, consagrando o pão e o vinho no Corpo e Sangue do Senhor.
O que não é possível é ser santo
sem que se seja, ao mesmo tempo, sacerdote e vítima. Olhando para a vida dos
padres que se santificaram, não se encontra um sequer que não se tenha vitimado
por amor a Jesus. É incompreensível, portanto, que os sacerdotes de hoje
queiram ser santos sem passar pela dura senda da oblação e do oferecimento de
si mesmo. Importa repetir, com São Nicolau de Flüe, em uma oração contida no
Catecismo da Igreja Católica:
“Mein Herr und mein Gott, nimm alles mir, was
mich hindert zu dir. Mein Herr und mein Gott, gib alles mir, was mich führet zu
dir. Mein Herr und mein Gott, nimm mich mir und gib mich ganz zu eigen
dir. – Meu Senhor e meu Deus, retira tudo de mim o que me separa de ti. Meu
Senhor e meu Deus, dá tudo a mim o que me conduz para Ti. Meu Senhor e meu
Deus, retira-me de mim e dá-me todo inteiro a Ti” [6].
Para participar da entrega que
acontece na Missa, é preciso estar como Maria aos pés da Cruz. Antes de cada
celebração eucarística, entreguemo-nos aos braços de Maria, a fim de que ela
nos ajude na entrega de nós mesmos.
Referências
1 Cf. Cl 1, 24
2 Cf. Jo 19, 34
3 A palavra “substância” faz
referência a algo que não está sujeito às leis do espaço e do tempo e,
portanto, não pode ser “imaginado” pela mente humana, capaz que é de perceber
apenas as realidades acidentais.
4 Concílio de Trento, Sessão
XXII, Doutrina sobre o santíssimo Sacrifício da Missa, n. 940. Cf.
Denzinger-Hünermann, 1743
5 Carta encíclica Mediator Dei,
20 de novembro de 1947, n. 63
6 Catecismo da Igreja Católica,
226
Fonte: www.padrepauloricardo.org/
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